quinta-feira, 30 de abril de 2009

O motorista

Sentado em seu banco forrado com aquelas bolinhas de madeira - o que denuncia a sua cafonice, ou, para ser mais "respeitoso", o seu conservadorismo - vai o motorista pela estrada das suas frustrações.

A cada curva é como se encontrasse com seus sonhos não realizados, que deixa para trás assim como tudo o que gostaria de ser e não foi. Nunca será, na verdade, pelo simples fato de ser um homem obtuso, preso às suas bossalidades e cheio de recalques e verdades falidas, estas que estão loucas para sair, e qualquer motivo - não importa qual seja - é pretexto para soltá-las. Verdades acerca de seu trabalho, do sacrifício que faz todos os dias, da forma reta com que age com as pessoas - retidão que disfraça suas sinuosidades.

Assim vai o fracassado motorista, sentado em seu trono de frustrações e ressentimentos, que ele mesmo construiu com sua notável mediocridade. Não há como sentir se quer pena desse ser desprezível, já que escolheu ser assim, esse bossal mascarado de bom homem, que nada mais é do que uma estrada esburacada e cheia de curvas.

domingo, 26 de abril de 2009

Vamos imaginar...

- Vamos imaginar que estamos num lugar onde vemos ovelhas pastarem e beija-flores passeando pelas rosas lascivas, sedentas do beijo do pequeno amante. O céu está tristemente azul, as nuvens cansadas, passeiam pelo céu vagarosamente, como numa marcha fúnebre. Os animais todos calmos, mas uma calma melancólica, que torna a atmosfera lenta.
O lago estaria como um espelho imóvel se não fossem os patos a riscarem o espelho com seu rastro suave. As árvores todas silenciosas, mal balançam seus galhos, pois o vento também está preguiçoso.

- O que faremos diante dessa cena tão mórbida? - pergunta Clara a Augusto, que a olha ternamente. Ele então acaricia seu rosto e diz suavemente.

- Clara querida, vamos andar pela relva, molhar os pés nas calmas águas do lago, alimentar os patos e apreciar a tristeza azul desse céu. Vamos caminhar como as nuvens, vagarosamente, porque não há pressa, meu bem. O tempo é nosso...

E Clara então levantou-se e puxou Augusto pelas mãos e disse: "Vamos", e começaram a caminhar pelas movimentadas e barulhentas ruas do centro de São Paulo.

O olhar fala silenciosamente o que não conseguiríamos dizer com nenhuma palavra. Os olhos são as línguas mudas da alma, que sussurram palavras às vezes doces, outras fatais. Porém os olhos falam, diferente das rosas, que o poeta confessou que não, não falam.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Despertar de uma ilusão

Às vezes um tempo de silêncio e recolhimento sirva para muitas coisas. Sirva principalmente para você se dar conta que vive rodeada de sanguessugas, oportunistas que querem de todas as maneiras prejudicá-lo.

Isso não é nenhuma novidade, mas somente acordamos para isso quando passamos por um momento de interiorização.

Talvez seja completamente saudável que todos possam passar por esse momento algumas vezes na vida para acordar desse sonho imbecil de que tudo é cor-de-rosa, que a felicidade existe e que, quando morrer, anjinhos peladinhos irão ao seu encontro no céu.

Não meu bem, não existe céu, muito menos o mundo é cor-de-rosa; na verdade é cinza.