sexta-feira, 9 de maio de 2008

Um Bêbado...


Esta história é um fato verídico. Os nomes foram alterados para que a identidade das pessoas envolvidas fossem preservadas. Qualquer semelhança, nesse caso, não será mera coincidência.

Teresa e Antônia estavam conversando tranqüilamente como sempre o faziam. Era noite, fazia um pouco de frio. O céu estava limpo, a lua, ainda que em sua fase menos iluminada, estava desempenhando seu papel de tornar até a noite mais fria, em um belo espetáculo. Tudo corria como de costume, dentro da normalidade medíocre de uma cidadezinha pretensiosa.

Às vezes, quando as coisas vão bem, sempre dizem que é por pouco tempo. Realmente, nesta noite as coisas tomariam um rumo que seria trágico, se não fosse cômico. Seria a demonstração de que o homem pode sim chegar ao fundo do poço, ou até mesmo, cavar além do poço. A demonstração da mais pura auto-piedade, da falta de orgulho e amor-próprio que leva o homem a passar pelo ridículo em troca de atenção, de alguém que possa escutá-lo, mesmo que por pena. E até mesmo que possam rir dele, pois o ridículo já não importa mais.

Ao olhar para o lado, Teresa toma um susto ao se deparar com um homem bêbado, olhando para ela como se encontrasse uma alma caridosa que possa escutar seus lamentos. Antônia também assustada não sabe o que fazer. A escolha mais sensata seria escutar, responder com desdém - mas não deixando transparecer - e depois sair de perto, ou esperar que o bêbado saia primeiro.
Suas roupas não eram rasgadas, não estava sujo, mas todo aquele ar de embriaguez o tornava insuportável.

- Minha mulher morreu, era parecida com você - dirigindo-se à Teresa - eu durmo, todos os dias no túmulo dela - falava enquanto mostrava toda a sua dor, misturada com álcool e auto-piedade.

Todas as respostas eram, nada mais, uma tentativa de disfarçar o riso. Ainda que ele possa realmente estar sofrendo, torna-se cômico por banalizar sua dor, contando a quem quiser ouvir.
Seus olhos até lacrimejavam, nos primeiros cinco minutos sentiram pena. Nos próximos sentiam vergonha, logo depois raiva, irritação.

Alguns amigos de Teresa e Antônia vieram para tirá-las de perto daquele homem inconveniente. Após alguns minutos o bêbado retornou, com uma nova estratégia. Iria cantar. Tentar cantar, pois a bebedeira era tanta que mal conseguia pronunciar as palavras. Na verdade não cantava, gritava, balbuciava palavras que nem sabia o que eram, se quer sabia se existiam. Todos se olharam e o riso foi inevitável. Aquele homem embriagado já não sabia que o riso representava a piedade das pessoas frente a um ato totalmente ridículo e sem propósito algum.

- Bom - disse um dos amigos de Teresa e Antônia - acho que o senhor já cantou e pode ir embora agora.

Sua saída não durou um minuto, e novamente o inconveniente retorna com um novo apelo. Aliás a junção do canto com as ameaças.

- Eu sou psicopata, eu sou maluco! Vocês não me conhecem!

O comportamento de todos ali já mudara. Não havia mais a tolerância quanto ao estado deplorável que o tal homem se encontrava. Teresa, começou a mandá-lo embora, mas parecia que seu cérebro alcoolizado não assimilava mais as palavras. Chegou a oferecer seu terço que carregava na mão à Teresa, que num ato de repugnância, quase joga o objeto no chão. O seu apego ao terço é tanto que volta atrás e pede-o de volta. Agora seu novo e último apelo é a religião. Mais precisamente Jesus.

- Jesus ama vocês!

A impaciência tomara conta de todos, a piedade não existia mais. Viraram as costas e deixaram falando sozinho o bêbado, com Jesus e seu terço. Após todo esse circo, o riso foi inevitável. Mas não se pode negar que, o que foi presenciado é a prova mais forte de que o homem pode perder seus escrúpulos, seu orgulho e vir a ser uma piada, uma pessoa digna de pena, de quem se ri e que não é levado a sério. Uma pessoa que busca na bebida um refúgio traiçoeiro, que ao invés de proteger leva o embriagado a cometer atos estúpidos e tolos.